Parasitas em peixes são objeto de estudo inédito no Brasil

Professor Gilberto Pavanelli orienta pesquisa que analisa espécies em tempo real na Amazônia e no Paraná

Por Murilo Benites

Ao longo dos anos, diversas espécies de peixes, oriundas de outras regiões do país, foram e estão sendo introduzidas nos rios do Paraná. Entre outros motivos, o principal foi a tentativa de repovoamento das bacias do estado, que em alguns períodos mostraram escassez de peixes. No entanto, uma pesquisa da UEM revela que, em determinados casos, o que se pensou ser algo benéfico, acabou se configurando como um erro.

Investigações apontam para o fato de que algumas espécies exóticas trazidas para os rios paranaenses causaram uma série de problemas aos peixes que já viviam por aqui. Uma das espécies introduzidas, a Corvina, além de ser extremamente voraz, não encontrou um inimigo natural nessa região. Como conseqüência, passou a se alimentar de outros peixes e, com o ambiente favorável, a se espalhar cada vez mais. Ou seja, o sucesso da Corvina na região de Itaipu, onde o povoamento aconteceu de forma mais intensa, se deu às custas da diminuição de outras espécies naturais dos rios paranaenses, como o Pintado, o Barbado e o Dourado, que são também mais importantes que a própria Corvina, do ponto de vista econômico.

Outro agravante é que os peixes “importados” também trouxeram com eles alguns parasitas que não existiam aqui e que acabaram atingindo outros peixes da região. Um dos parasitas, trazido pela Corvina, ataca o olho dos peixes, provocando uma opacificação do cristalino (espécie de catarata) que impede o peixe de nadar, buscar o alimento e inibe a capacidade dele se defender.

Hoje, já é possível encontrar esse parasita (antes presente somente na Corvina), em peixes naturais dos rios paranaenses, como Traíras, Piavas, Piaus, Cascudos, Sagüirus, Surumanhas e até em Tucunarés, que foram também introduzidos na região e que não possuíam registros desse parasita em seu habitat natural, a Amazônia.

Para comprovar esse fenômeno na prática, o professor Gilberto Cezar Pavanelli, acompanhado das alunas do Programa de Pós-Graduação em Ecologia de Ambientes Aquáticos (PEA), da UEM, Ana Carolina Lacerda e Luiza Lopes, estão realizando um projeto que visa detectar o parasita e verificar a ação dele em quatro espécies oriundas da bacia amazônica, que foram introduzidas no Paraná: a Corvina, o Tucunaré, o Apaiari e o Acará-joel.

Segundo Pavanelli, o projeto recebeu R$ 33 mil de apoio do Governo Federal e quer “observar, em tempo real, as mesmas espécies na Amazônia e no Paraná. Estudar, ao mesmo tempo, duas bacias absolutamente diferentes para fazer o balanço da agressão de espécies exóticas e as consequências deste problema em termos econômicos e de meio ambiente é algo absolutamente novo no país”, diz Pavanelli. O professor teve, em 1998, seu sobrenome atribuído a um gênero e uma espécie de novos parasitas de peixes (o Pavanelliella pavanellii), em homenagem às suas pesquisas sobre o assunto.

Evitando erros

Os dados levantados pelo projeto vão permitir a identificação dos parasitas que atuam sobre as quatro espécies nas duas regiões, descrevendo suas características e efeitos sobre a saúde dos peixes e comparar os dados entre as regiões estudadas. Além disso, o projeto visa observar se os peixes com diferentes intensidades de parasitismo apresentam diferenças no seu fator de condição (saúde). “Também queremos investigar se as espécies de parasitas introduzidas são encontradas em outras espécies de peixes nativos da planície de inundação do alto rio Paraná”, afirma o professor.

A coleta de peixes para análise está sendo concentrada em dois pontos. No Paraná, em Porto Rico, onde se encontra uma base do Núcleo de Pesquisas em Limnologia Ictiologia e Aqüicultura (Nupélia); e no Amazonas, em Coari (a 500 quilômetros de Manaus), região do médio rio Solimões.

Em outubro do ano passado, acompanhado de suas alunas, Pavanelli realizou a primeira coleta de peixes. “Ficamos dez dias em Coari recolhendo espécies, que foram trazidas para Maringá para serem analisadas aqui. No mesmo período, coletamos peixes também do rio Paraná para serem analisados”, conta. Já foi coletado um total de 220 peixes, sendo que esse processo será realizado novamente ainda esse ano, para possibilitar um estudo de comparação.

A respeito dos problemas já causados pelo povoamento inapropriado dos rios paranaenses, Pavanelli afirma que não há possibilidade de reverter a situação. “No estágio atual já é muito difícil. A tendência é que diminua cada vez mais as espécies naturais do Paraná.”

O professor ainda ressalta que o estudo de caso que está sendo realizado pode ser usado como exemplo, para evitar erros ambientais futuros. “É preciso tomar muito cuidado ao fazer qualquer tipo de ação junto ao meio-ambiente, já que isso pode ter repercussões muito mais negativas do que se possa imaginar”, afirma.